O que é um Roguelike?
- Coral Gelmo
- 28 de out. de 2024
- 7 min de leitura
Atualizado: há 5 dias

Hoje, remaremos rumo ao desconhecido em buscas de respostas para a pergunta que há décadas assola o inconsciente coletivo de gamers mundo a fora! O que é um roguelike? Ou Roguelite? A discussão é tão complexa que não conseguimos nem concordar com o nome do gênero ainda...
Lite e like... essa parte vamos deixar pra mais tarde! Vamos focar na parte do Rogue!
Pra começar minha pesquisa, fui ao google tradutor e joguei a palavra ROGUE, porque não sabia que diacho era isso.
O google me respondeu: Rogue, do inglês, significa “POR CONTA PRÓPRIA”; também falou que podia significar “trapaceiro, tratante, maroto e patife”, mas vamos focar na primeira tradução pelo bem da conversa.
Por conta própria!
Por uma ótica, podemos pensar que um jogo que te deixa por “por contra própria” pode significar “um jogo difícil”, maaaas, por outro lado, também podemos dizer que um jogo assim te da “liberdade” ou mesmo “senso de conquista”. Já está sentindo os miolos se retorcerem?
Bom, acontece que Rogue não é apenas uma palavra da língua inglesa com uma tradução curiosa, caro leitor. É também um jogo para computador de 1980!
O Roguelike original

Rogue foi Feito por Michael Toy, Glenn Wichman e Ken Arnold enquanto ainda estavam na faculdade e sem fins comerciais! Olha aí.
Rogue, além de GRÁTIS, é também um jogo de exploração de masmorras, onde tudo (ou quase tudo) é gerado aleatoriamente - ou no termo chique: proceduralmente.
Na prática, cada vez que se joga uma pá de coisa muda. Itens tem efeitos aleatórios, armas tem efeitos aleatórios, poções a mesmíssima coisa. Além de aleatórios, os efeitos podem ser bons, ou ruims. Surpresa a cada uso! Mapas também são criados aleatoriamente, junto com a posição e status dos monstros e inimigos.
Sabe o que mais é aleatório? A informação de que atualmente 2 dos criadores de Rogue são calvos, enquanto o outro ostenta uma belíssima cabeleira... que desrespeito não?
Talvez exatamente por esse tipo de arrogância Rogue 2 nunca tenha sido lançado. Que vergonha Senhor Glenn Wichman!

E foi exatamente esse cabeludo que, quando perguntado em uma entrevista sobre quais as características definem um roguelike, respondeu:
“Para mim, A característica quintessencial de um Roguelike é que o computador cria um mundo para você explorar. A aventura tem que ser sempre diferente e o jogo tem que ser capaz de surpreender até seus criadores.”
Rogue aparentemente surpreendeu tanto seus criadores que o próprio Gleen já admitiu nunca ter conseguido terminar seu próprio jogo. Como diria o fã de dark souls: Get Gud, Sr Gleen!
Brincadeira, brincadeira, eu mesma também nunca terminei Rogue! Tamo junto nessa, cabeludo.
Para muitos, o grande motivo para nem ele e nem eu termos conseguido terminar Rogue é a mecânica amada por alguns e odiada por outros... a PERMADEATH, traduzida como MORTE PERMANENTE!
Além de jogar rogue e não terminar, sabe o que mais o amigo Glenn eu temos em comum? Falar sobre Rogue nas redes sociais!! Confere aí o que ele disse sobre essa mecânica numa outra entrevista:
“Eu postei no meu facebook ontem: precisamos de um nome melhor para permadeath. Existe essa ideia de que fizemos o jogo dessa maneira pra torna-lo mais difícil, quando na verdade foi para dar senso de consequência, persistência e novidade. Em rogue temos itens aleatórios e misteriosos, entende?
Dessa maneira, se eu encontro uma poção, eu bebo ou não? Se achei um item, eu uso ou não? Pode ser bom, pode ser ruim. Se eu pudesse salvar o jogo, beber a poção e ver que é ruim, para então carregar o jogo salvo e não beber a poção... toda a mecânica do jogo simplesmente desaparece”
E o careca Michael Toy ainda deu a lacrada final:
“Estávamos fazendo com que as decisões tivessem mais importância para tornar rogue mais imersivo, mas não para fazê-lo mais difícil. Tudo foi feito para ser o mais divertido possível.”
Pessoalmente, eu concordo com os velhinhos: Roguelikes são bem divertidos e imersivos! Mas se engana quem acha que os únicos que se reúnem pra ficar falando do gênero são os desenvolvedores de Rogue.
A interpretação de Berlim
Diferentemente do nosso amigo Glenn Wichman, que tem uma visão muito mais aberta sobre o gênero, uma patotinha de desenvolvedores de roguelikes se juntaram na Alemanha em 2007 e definiram os “10 mandamentos do roguelike” (que na verdade eram 9)

Vamos conferir alguns deles?
1 – Amar a geração aleatória de ambientes acima de todas as coisas
2 – Fazer apenas jogos baseado em turnos
3 – Honrar a movimentação baseada em grids
4 – Não ter mais de uma única vida
Acho melhor pararmos por aqui, antes que algum leitor ateu desavisado se sinta ofendido com tantos dogmas.
Essa pequenina palinha das sagradas escrituras dos Roguelikes é o suficiente para entendermos que, para alguns, é mais fácil seguir os mandamentos do deus cristão do que fazer um roguelike.
Em outro paralelo com a cristandade: tal qual nossos amigos de cristo consideram todos os que quebram algum mandamento como “pessoas do mundo” ou “pecadores”, nossos amigos de Berlim chamam de RogueLITE os que desrespeitam a santa ordem do gênero.
Por exemplo: Toejam an Earl, lançado para Mega Drive em 1991, tinha um ambiente gerado aleatoriamente e morte permanente, mas não tinha movimentação em Grid, não era Hack and Slash e não era baseado em turnos! Ainda assim atingia o tipo de surpresa que deixaria nosso amigo Glenn Wichman de cabelo em pé. (e algum outro sentimento aos outros 2 carecas)
Roguelike é um bom nome pro gênero?
Talvez, após essa explanação toda, você já tenha sua opinião formada sobre “o que diabos é um roguelike”, mas talvez, assim como eu, você só esteja ainda mais perdido no poço da ignorância e desilusão.
Foi exatamente boiando nessa água fedorenta que me recordei de um outro jogo que emprestou seu nome a um gênero por um tempo: Doom! Doom, lançado em 1993, é o FPS responsável por popularizar o gênero.
Tão responsável que por alguns anos todos os FPS eram chamados de “Doomclone”Pra nossa sorte, a moda de fazer convenções em Berlim ainda não tinha começado, então nunca tivemos que lidar com “Doomlites”. Na realidade, pouco tempo depois o gênero passou a ser chamado de First Person Shooter, o famoso FPS. (Não o que você chora quando está em 59, o outro)
O engraçado disso tudo é que nos últimos anos surgiu um subgênero de FPS extremamente inspirado no Doom original e convencionamos a chamá-los de Boomer shooters (Numa tradução livre “jogo de tirinho de tiozão”) Nem no caso mais provável de ressurreição o nome Doomclone se firmou...
Talvez a solução para os Roguelikes e Roguelites esteja exatamente ai! Ao invés de só trocar uma letrinha, poderíamos inventar nomes para inúmeros subgêneros! Pensamos esse tempo todo que estávamos explorando UM gênero (as vezes dois, depende) quando na verdade temos vários!
Mas, e se Roguelike sequer for um gênero? E se for... uma filosofia de game-design?
A filosofia Rogueana

Uma filosofia de design é um conjunto de regras, principios e fundamentos que guiam o desenvolvimento de um jogo. De tal maneira que múltiplos gêneros podem se usar de principios de uma filosofia de design.
Isso explicaria a quantidade de gêneros diferentes com aspectos rogue que vimos nos últimos anos: Jogos de Carta, de luta, FPS, Metroidvania, Corrida, Ritmo e infinitos outros.Até mesmo um jogo onde você é funcionário “faz tudo” de um ônibus espacial. Alô Spacelines from the Far Out!
Uma de minhas favoritas é a filosofia por subtração, criada por Fumito Eda em Ico, jogo de ps2 lançado em 2001.
Num resumo, a filosofia por subtração é um conjunto de práticas de game design que visa excluir tudo que não corrobore 100% ao sentimento/experiência que o jogo quer passar. Sabe aqueles jogos da senhora Ubisoft cheio de mecânica pra encher linguiça e mapas super inflados? A Filosofia por subtração é o oposto disso.
Na prática isso pode se traduzir em coisas como gráficos minimalistas, diálogos curtos ou metafóricos, trilha sonora pontual e reduzida, gameplay com pouca variedade de movimentos/ações.
Em Journey, lançado em 2012, vemos vários traços de design por subtração. As únicas ações do jogo são pular e dar um gritinho, por exemplo. Tudo no jogo existe para dar a sensação única de estar em uma jornada.
Esses fundamentos que formam uma filosofia de design não são regras que devem ser seguidas a ferro e a fogo, mas um guia para se ter um efeito bem característico em seu jogo.
No caso do Design por subtração, a intenção é de se ter uma simplicidade profunda, onde todos os elementos que compõem o jogo servem para causar uma única sensação.
Talvez, no caso da recém nomeada Filosofia de Design Rogue, a intenção seja de se atingir uma experiencia diversa, surpreendente e engajante que te cause a sensação de que seu esforço e aprendizado são uma parcela fundamental de seu mérito em avançar no jogo.
Podemos dizer então que Rogue não inventou um gênero, mas criou uma das filosofias de design mais influentes de toda a história dos jogos! Em outros termos, um jogo indie de 1980 criou uma das filosofias mais presentes nos jogos indies atuais.
Acho interessante refletir que Rogue não era apenas independente, como sem fins lucrativos. (Independente dos ports pagos feito posteriormente, o jogo original não fora feito com a intenção de ser comercializado.)
Bem diferente da filosofia de design dominante dos anos 1970/1980 que só queriam tirar o máximo de suas poucas moedas: Os benditos Arcade. O Design Rogue não serve para fazer um jogo absurdamente lucrativo, mas sim para fazer jogos divertidos e recompensadores!
Se pensarmos que não existem jogos AAA que utilizem da filosofia Rogue, apenas jogos caseiros ou independentes, talvez seja justo dizer que a filosofia de design de lucros máximos seja a dominante até hoje, apenas trocando a modalidade predatória de moedas para microtransações.
Apesar disso, hoje vivemos o auge da popularização de jogos inspirados em Rogue, mas qual seria o futuro do Design Rogue?
Nosso querido Glenn Wichman, ao ser perguntado sobre o que gostaria de ver sendo feito em Roguelikes modernos, respondeu:
“Não consigo pensar em muita coisa, na verdade tudo que fizeram já me deixou muito surpreso.”
Eu também sempre fico surpresa com os novos jogos inspirados em Rogue lançados todo ano, mas tem uma coisinha bem especial que eu gostaria de ver sendo feita pelos jogadores destes jogos: A aposentadoria dos termos roguelikes e roguelites.
Extra: Conceito moderno de Roguelite
Em 2024 não precisamos viajar de avião pra Berlim quando queremos discutir sobre a conceituação de jogos rogue, basta entrar no Reddit! Uma galeria do barulho do sub r/roguelite vem há alguns anos afunilando o que pode e não pode ser considerado um rogueLITE.
Para eles, o que caracteriza um roguelite é a chamada "meta-progressão". Caso você esteja absolutamente abestalhado com o termo, eu explico:
Em um rogueLIKE os itens são aleatorios, pode ser que no bau da primeira sala tenha uma poção que cura 10 pontos de vida ou um veneno que tira 10 pontos de vida.
Em um rogueLITE é a mesma coisa, porém, entre uma partida e outra você desbloqueia um upgrade que aumenta para 20 pontos curados para a poção, ou reduz para 5 o veneno.
Essa é a meta-progressão! Basicamente upgrades e itens/habilidades des bloqueaveis entre as partidas.
Particularmente isso me soa como: A convenção de Berlim 2: o inimigo agora é o mesmo.
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